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“Brasil, pátria educadora” sob vigilância!

22/01/2015
Com o lema "o que tá bom vai continuar, o que não tá, a gente vai melhorar", a campanha da presidenta Dilma Rousseff ganhou as ruas do Brasil, conquistou a maioria da população e a vitória no segundo turno das eleições, de 2014. O povo comemorou a continuidade do projeto que avança na perspectiva de superação das desigualdades sociais, econômicas e políticas no país.

Em seu discurso de posse, a presidenta cunhou o slogan de seu novo governo: "Brasil, Pátria Educadora". Como assim, pátria educadora? A pergunta caiu feito uma bomba na cabeça da maioria absoluta dos governos municipais e estaduais.

Por se tratar de um tema caro aos governos brasileiros, que remonta séculos de atraso, a dívida com a educação não começou nem vai acabar nos governos de Lula e de Dilma, mesmo que saltem aos olhos os avanços dos últimos 12 anos. Considerando que foram retiradas das gavetas escuras do Ministério da Educação metas que lá dormiam desde a Conferência de Jontiem, na Tailândia de 1990, asseguradas, inclusive, no Plano Decenal de Educação para Todos aprovado em 1994.

E referenciadas tanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996, como no Plano Nacional de Educação, em 2001, tais como a erradicação do analfabetismo, a universalização da educação básica, o acesso ao ensino superior e a valorização do magistério (incluindo formação inicial e continuada dos professores, planos de carreira e definição de pisos salariais), assim como o aumento do financiamento da área para 10% do PIB (fixado em 7% no PNE de 2001 e vetado por FHC). Tais metas, porém, foram negligenciadas pelos governos anteriores, a maioria nem saiu do papel.

O Piso Salarial Profissional Nacional dos Professores da Educação Básica, por exemplo, merece especial comemoração, por ser o ponto culminante de uma luta de mais de meio século, consagrada no governo Lula pela Lei 11.738/08.  Contestada imediatamente pela maioria dos governos estaduais e municipais, ela precisaria de mais cinco anos no Supremo Tribunal Federal para ser validada.

Mas por que contestar a Lei do Piso Salarial, se todos reafirmam o discurso de que o magistério deve ser valorizado? "Elementar, meu caro Watson!", diria Sherlock Holmes: isso envolve dinheiro, grana, money, dindim – algo precioso às administrações municipais e estaduais.

No Brasil, não há um Sistema Nacional de Educação, mas três sistemas que atuam solidariamente (o federal, os estaduais e os municipais). Por possuírem ordenamento jurídico próprio e autonomia na implementação das políticas educacionais definidas pelo MEC, essas esferas acabam entrando em atrito na hora de definirem atribuições e responsabilidades.

Nesse sentido, a ausência de um Sistema Nacional Educação abre margem para que governos estaduais e municipais negligenciem a aplicação da Lei do Piso Salarial dos Professores. Isso também dificulta a ação da União na fiscalização dos recursos, ainda que os sistemas tenham a obrigação de institucionalizarem seus Conselhos de Fiscalização dos recursos do Fundo, tanto em nível estadual como municipal.

Com o propósito de dirimir esses impasses foi proposto na primeira Conferência Nacional de Educação, em 2010, a construção de um Sistema Articulado Nacional de Educação, mas, infelizmente, a sugestão acabou se perdendo em meio a debates e foi abandonada. Comenta-se que a indicação de Cid Gomes para Ministro da Educação, ex-prefeito de Sobral (CE) e ex-governador do Ceará, cumpra também o papel de articulador político junto aos governos estaduais e municipais, com vistas em viabilizar a implementação das políticas educacionais que necessitam de parceria entre as esferas de governo. Com 16 anos de experiência em cargos executivos, ele seria o homem certo para o trabalho.

O fato é que o ministro convidou para o anúncio do novo valor do Piso Salarial do Magistério no início deste mês (07), cuja cerimônia contou com a presença das entidades representativas da área da educação, sejam elas de classe ou de governo e todas compareceram. Em especial a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (CONSED).

O anúncio do reajuste de 13,01%, que altera de R$ 1.697 para R$ 1.917,78 o valor do Piso Salarial, foi acatado com entusiasmo pela representação dos trabalhadores, embora ainda esteja defasado pelos os cálculos da CNTE que divergem do cálculo feito pelo MEC. Enquanto que as entidades representativas dos governos estaduais e municipais, Undime e Consed, lamentaram o reajuste, alegando que os 60% do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação) não são suficientes para cobrir as despesas. Esta parcela é destinada exclusivamente ao pagamento de salários dos docentes.

É preciso coibir a má gestão

Sem entrar no mérito das receitas da educação que estão para além do Fundeb, o fato é que foi o reajuste do piso que reacendeu a chama do impasse e 2015 promete ser o ano de muita luta para fazer valer a lei, garantindo que os sistemas de ensino assumam a valorização do magistério como parte essencial do projeto de nação igualitária.

Isto posto, é bom que se diga, o problema está relacionado mais à gestão do que à receita, ainda que se considere a necessidade de aumentar o investimento em educação, conforme prevê o PNE. É importante enfatizar que a má gestão de recursos está ligada intrinsecamente ligada à má qualidade da educação.

Não são poucos os gestores estaduais e municipais que burlam a aplicação dos 60% do Fundeb, que é exclusivo o para pagamento de salários de professores e incluem, por exemplo, o pagamento de toda a folha das secretarias de educação. Em outros casos, paga-se salários reduzidos, inferiores ao valor do Piso, para que no final de cada ano fiscal sejam repassadas as "sobras do fundeb" em forma de abono, evitando a devolução dos recursos. Essa prática é condenada pelos sindicatos dos trabalhadores em educação, mas, aceitável pelos órgãos de fiscalização.

Segundo a CNTE, metade dos governadores cumprem parcialmente a lei do Piso, ou seja, pagam o valor do salário, mas não atendem a jornada, nem a carreira, e pelo menos sete governadores e a maioria dos prefeitos a descumprem completamente. O mais grave é que não há punição prevista para os maus gestores dos recursos da educação.

O que explica, a reação do Consed e da Undime que na prática são as orientações dos gestores, via associações de prefeitos, propondo estudar medidas de contenção de gastos, que vão na contramão da proposta da presidenta para tornar o Brasil uma pátria educadora. É, no mínimo, uma afronta propor o aumento do número de alunos por sala, contrariando a meta de reduzi-los gradativamente até o número de 20, 25 e 30 alunos por sala na educação infantil, fundamental e médio, respectivamente, como previsto na legislação.

Outro acinte à lei é reduzir o número de escolas rurais, apostando na concentração em comunidades com maior número de habitantes. A terceira é acabar com o ensino noturno, mais especificamente a Educação de Jovens Adultos (EJA), sob o argumento de que a evasão dos alunos ao longo do ano gera prejuízo aos cofres públicos. Num país em que os índices de analfabetismo ainda está em dois dígitos, essa é uma postura preocupante.

De modo que, embora a educação seja pensada para além da escola, passa necessariamente por ela, as melhorias na qualidade do ensino e na valorização dos profissionais que tornam isso possível. Portanto, recomendo vigilância absoluta aos maus gestores estaduais e municipais, inimigos da educação para que a "pátria educadora" não se transforme em redução de espaços escolares ou aumento de alunos por turma, sob o argumento da falta de recursos.

E assumir em conjunto a defesa da educação pública, gratuita e de qualidade, que nenhuma criança, jovem ou adulto deixe de estudar por falta de vontade política dos governantes.

Raimunda Gomes, secretária de comunicação da CTB
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